Como transformar a cidade num hub de startups?
Desenvolver a nova geração de cidades baseadas em inovação e tecnologia é a nova agenda de gestores públicos e lideranças locais. O objetivo é transformar a estrutura econômica da cidade criando (ou tentando criar) formas para reter e atrair novos talentos que possam criar empresas capazes de gerar riqueza a partir de modelos digitais, disruptivos, escaláveis, etc.
Tradicionalmente uma boa forma de desenvolver estratégias é olhar para cidades que conseguiram chegar nesse patamar e analisar o que foi feito, embora seja fundamental sempre contextualizar os fatos para não fazer um simples “ctrl C + ctrl V”. Nos EUA poderíamos citar o Vale do Silício ou NY, enquanto que no Brasil poderíamos citar Recife (com o Porto Digital) e Florianópolis como bons exemplos de cidades que conseguiram fazer a transformação na sua matriz econômica, saindo de uma realidade de baixo valor agregado para uma focada em inovação e tecnologia de alto valor agregado.
Nas eventuais leituras sobre o tema me deparei com uma palestra que o investidor Paul Graham, da Y Combinator, fez para a cidade de Pittsburgh na qual ele abordava o que a cidade deveria fazer para tornar-se um hub de startups. Sendo natural de Pittsburgh e atualmente morando no Vale do Silício ele conseguiu criar parâmetros inspiradores e mostrou que o ecossistema de inovação busca energia e se fortalece muitas vezes em fatores não relacionados à tecnologia em si.
Um dos aspectos principais, e que na verdade não é segredo para ninguém, é que as cidades precisam conseguir reter/atrair os jovens na faixa dos 25-29 anos. Essa é uma parcela que normalmente já está formada e possui conhecimento para criar ou atuar em empresas de tecnologia, e nessa fase tem liberdade para mudar para onde encontrarem melhores oportunidades. E é aqui que as cidades devem focar os seus projetos.
E quando falamos em focar os projetos é entender como se pode criar uma cidade que seja boa para essa parcela da população. Em Pittsburgh, por exemplo, havia uma onda de novos restaurantes, bares e cafeterias que estava transformando a paisagem urbana. As pessoas se relacionavam nesses espaços e segundo Paul a cidade deveria facilitar ainda mais a criação e manutenção desses espaços porque eles criam energia e vibração na cidade, fazendo com que os jovens queiram ficar.
Um segundo ponto importante é o custo da moradia. Cidades que são “caras” não atraem novos moradores, especialmente aqueles que estão iniciando suas vidas de forma independente. Desta forma, é muito importante mantermos estruturas que sejam antigas, mas que ainda possibilitem uma boa qualidade de moradia. Além disso, essa moradia precisa ser facilmente acessível, ou seja, ela não pode estar distante/na periferia, mas sim estar a poucas quadras a pé ou a alguns minutos de bicicleta.
E aqui entra o terceiro ponto: a cidade precisa ser caminhável. As pessoas precisam ter a capacidade de misturar meios de transporte durante os seus trajetos, tais como transporte público, bicicleta, caminhar. As novas gerações querem depender cada vez menos dos automóveis e as cidades precisam entender isso e preparar o seu território para esses novos desejos.
O quarto aspecto é ter uma Universidade de ponta. Segundo Paul as universidades devem ser um ímã de talentos, mas não mais do que isso. E para que esse trecho não fique mal entendido o que ele quis dizer é que as universidades não devem puxar para si a incumbência de tornar a cidade mais inovadora, mas sim de criar programas específicos sobre determinadas tecnologias que possam atrair estudantes que queiram se aprofundar no assunto e dali fundar suas próprias empresas. A universidade é o local ideal para juntar futuros empreendedores, mas ela não deve institucionalizar o processo de empreendedorismo.
O quinto ponto tem a ver com as pessoas que vivem na cidade. Um ecossistema de inovação precisa de uma comunidade que aceita tranquilamente os diversos tipos de pensamento. Não estou falando de “tolerância”, ou seja, “não gosto disso, mas tolero”. Estou falando de conviver de forma igual e respeitar todas as pessoas que escolherem a cidade para viver. Culturas fechadas não permitem o desenvolvimento da diversidade de pensamentos e isso é tóxico para o ecossistema de inovação.
E por fim, o bom e velho pilar de “investimento”. Nos ecossistemas mais evoluídos é fácil perceber a presença de fundos de investimento ou investidores anjo que apostam nas startups, mas nas cidades que estão iniciando esse processo esse movimento é mais tímido.
A boa notícia é que fundar uma startup já é bem mais barato que antigamente e além disso já existem alternativas como financiamentos coletivos que permitem que você fique onde quiser. No entanto, esse é um ponto de atenção para os líderes locais porque o crescimento da cultura de investir em startups traz outros benefícios, como a busca profunda por parte de quem investe em conhecer esse mercado, um melhor apetite ao risco e principalmente o incentivo à utilização e experimentação dessas novas tecnologias que vão sendo criadas, o que auxilia na validação dos projetos.
O caminho para essa transformação não é rápido, mas pelo menos é um caminho atingível. Além disso, essa viagem mostra belas paisagens pelo trajeto e traz inúmeros benefícios que serão bons para a cidade independentemente se ela se tornar um hub de startups ou não. Encorajar novos restaurantes e cafeterias, promover moradias acessíveis na área central da cidade, ter inúmeras opções de deslocamento, ter uma cidade aberta a novas pessoas… Se a sua cidade já é boa agora, imagina com todos esses aspectos ainda mais desenvolvidos 😉